Vivemos num mundo de contradições: o acesso a alimentação ficou muito mais fácil do que em qualquer outra época da humanidade e ao mesmo tempo comer deixou de ser necessário e natural para a vida e passou a ser problema.

Problema de gordura, problema de saúde, problema de sustentabilidade, problema de orientação ideológica.

A problematização da alimentação reflete um tipo de adoecimento, um sintoma que encobre a real angústia que só aparece através de caminhos trocados.

A alimentação que deveria ser fonte de prazer vira desprazer o tempo todo. É através da comida que muitos afetos reprimidos se manifestam, o corpo e a comida podem virar a forma de expressão de angústias, culpas e medos.

O trabalho terapêutico tem a função de trazer esses afetos reprimidos para a percepção consciente para que esse desvio seja corrigido e a energia passe a ser utilizada para a vida e não mais destrutivamente.

A bulimia e a anorexia são os distúrbios alimentares mais graves da atualidade que atingem em geral adolescentes predominantemente do sexo feminino.

Outros hábitos alimentares que parecem mais comuns também podem encobrir patologias menos severas mas que se não cuidadas a tempo podem converter-se em sintomas mais graves.

Um desses hábitos é o que coloca o ato de comer na condição de responsável pela ideia onipotente de poder controlar a vida e a morte.  É a  “medicalização” da alimentação, muito comum nas conversas cotidianas. É como se o alimento fosse responsável por  curar ou prevenir doenças. O que é fonte de nutrição e prazer para a manutenção da vida vira magicamente solução para todos os males do organismo.

Essa é uma forma ilusória de lidar com a angústia frente ao desconhecido. A morte é a mais  cruel de todas as incertezas. Sabemos que ela virá mas não sabemos quando.

Tentar fugir dessa angústia com a ideia equivocada de controle sobre o incontrolável é um sintoma contemporâneo. Esse é mais um distúrbio alimentar de um período de fartura para a maioria dos povos desse nosso milênio. Nunca a humanidade teve tanto acesso a tanto alimento e nunca viveu período de tantas doenças ligadas a alimentação como este que estamos vivendo.